Saturday, March 19, 2011

Atrasadinhos mas sempre a tempo (3/3)


Esta pequena série de posts é sobre aqueles discos que merecendo um lugar de destaque não incluí neste mosaico. São álbuns que saíram mesmo na recta final do ano ou que, por nenhum motivo em especial, ainda não tinha ouvido. Venho agora redimir-me dessas 'falhas'.


Runaway


Dark Fantasy


Lost in the World


Gorgeous


So Appaled

Kanye West é um personagem com quem não me identifico. Apesar de tudo tenho de admitir que, mesmo sem acompanhar a sua carreira de perto Kanye tem lançado singles certeiros e, na maior parte das vezes oportunos. Ainda assim, até há bem pouco tempo, não havia assim nada que me convencesse definitivamente a ouvir um disco dele na íntegra.

Com o lançamento deste My Beautiful Dark Twisted Fantasy, talvez pela primeira vez, Kanye captou a atenção do mundo mais pela sua música do que pelo seu ego e pelas polémicas que o rodeiam constantemente. A crítica foi avassaladora e praticamente unânime - My Beautiful Dark Twisted Fantasy foi carimbado de obra prima. Gerou-se um burburinho enorme e o comboio do hype saiu da estação com toda a força. Movido por um cepticismo preconceituoso pensava "deixa-os andar que isto passa-lhes..." mas estava errado. Não passou. Pelo contrário, durante aqueles primeiros meses o comboio ganhou ainda mais velocidade e acabei eu próprio por embarcar também.

Quando me decidi finalmente a ouvir, colei logo no tema de abertura - é assim mesmo que deve ser. Dark Fantasy bateu-me quase como uma daquelas epifanias que partilho aqui volta e meia. Pensei "Sim senhor! Isto assim é capaz de valer a pena!" e valeu mesmo.
Embora às vezes pareça, Kanye West não é burro nenhum - para comprovar isso basta passar os olhos pelo rol de convidados deste disco. Com nomes que vão desde Rihanna e Jay-Z até Justin Vernon (dos Bon Iver) ou Kid Cudi e Raekwon (e uma participação hilariante de Chris Rock) West conseguiu chamar para si a atenção de vários nichos musicais que raramente se misturam.

My Beautiful Twisted Dark Fantasy é uma história sombria e bem delineada sobre a fama - uma ópera pop como tem sido muitas vezes chamado. A ambição, fama e sucesso seduzem (Dark Fantasy, Gorgeous e Power). As pessoas ficam deslumbrada com um mundo falso de luzes e futilidades (All of the Lights). As tentações e os vícios são tantos que se não houver auto-controlo suficiente acabam por corromper as pessoas que nelas se envolvem, retirar-lhes todas as noções e transforma-las em monstros (Monster, So Appalled). Quando as pessoas se apercebem de que de que nem tudo é um mar de rosas e que se está afinal a deixar muita coisa importante para trás procura-se fugir... mas nem sempre se vai a tempo (Devil in a New Dress, Runaway, Hell of a Life e Blame Game). Por vezes a metamorfose é irreversível e acaba por levar à 'morte do artista' (aqui, morte tanto pode ter um sentido literal como metafórico) deixando-o perdido e à deriva (Lost in the World).

Autobiográfico ou não, este trabalho de Kanye West é um retrato meticuloso acerca da fama fácil e da dificuldade que há em gerir todas as tentações sem acabar destruído por elas. My Beautiful Twisted Dark Fantasy é isto mesmo - é ambição, é fogo de vista, é exploração, é deslumbramento, é desilusão, é ascensão e é queda, é tudo o que a América descartável representa e não se sabe quem consegue afinal sobreviver a este mundo (Who Will Survive in America) sem voar demasiado perto do Sol e acabar queimado.


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