A sofisticação com recortes intimistas do nono álbum da banda de Stuart A. Staples é a companhia perfeita para um longo e solitário serão.
Neste conjunto de nove canções (apresentadas na íntegra ao público português no Festival Para Gente Sentada), é a voz grave e confortante de Stuart A. Staples quem comanda. Excepção à regra será a aparentemente inocente mas (muito) surpreendente Chocolate. Em nove minutos spoken-word (os primeiros do disco) somos introduzidos, pela voz de David Boulter (usualmente o teclista de serviço), ao labirinto de ruas nebulosas que constitui o mundo dos Tindersticks. Enquanto a aura misteriosa de Medicine (o primeiro single) e A Night So Still - a par do calor acolhedor e imediato de Show Me Everything e This Fire of Autumn - só contribuem para uma maior imersão nessas ruas sem fim, o swing quase dançável de Slippin’ Shoes e a urgência desconcertante de Frozen dão ao disco um toque apurado de variedade e equilíbrio sem, no entanto, nos sacudir para fora do seu universo.
Meticulosos na arte de fazer música, Stuart Staples & Cia. enriquecem as suas composições com milhentos pormenores minuciosos que dificilmente serão apreendidos à primeira. De facto, a cada audição repetida de The Something Rain descortina-se algum novo detalhe que havia, até então, passado despercebido. Deste modo, os temas - e portanto o álbum como um todo - tornam-se sucessivamente maiores e mais estimulantes tal e qual como um bom disco deve ser.
Ouvindo The Something Rain fica a agradável sensação de que acabamos de passar um final de tarde com um velho amigo que já não víamos há muito tempo. Essa sensação de conforto é, simultaneamente, a maior valia de The Something Rain e a dos Tindersticks enquanto banda. Num mundo cada vez mais repleto de incerteza e apreensão, ter um porto seguro para atracar - nem que seja por apenas 50 minutos - é claramente uma dádiva rara e, portanto, muitíssimo bem-vinda.